O Plenário do Conselho Nacional de Justiça
(CNJ) impediu que postos de dois cartórios, vagos pela saída dos
titulares, fossem assumidos por parentes dos antigos responsáveis.
No primeiro caso, os conselheiros reforçaram a decisão do Tribunal de
Justiça do Paraná (TJPR) de não permitir que um cartório do Paraná fosse
assumido pelo marido da antiga oficial do Registro de Imóveis da Comarca
de Barbosa Ferraz. No outro caso, o CNJ negou provimento a um recurso da
filha da antiga responsável pelo cartório de notas e registros da Comarca
de Nova Santa Rita, no Rio Grande do Sul, que queria assumir o cargo
independentemente do parentesco entre as duas.
Por se tratar de um serviço público que é delegado a pessoas aprovadas em
concurso público, os conselheiros aplicaram nos dois julgamentos os
princípios constitucionais da impessoalidade e da moralidade na
administração pública. Ambos são requisitos para o funcionamento dos
órgãos da administração pública da União, dos Estados, do Distrito Federal
e dos Municípios, direta ou indireta, conforme o artigo 37 da Constituição
Federal.
A relatora do Procedimento de Controle Administrativo (PCA
0005082-46.2017.2.00.0000), conselheira Iracema do Vale, lembrou a Súmula
Vinculante n. 13, que informa a interpretação do Supremo Tribunal Federal
(STF) sobre o tema. Editada em 2008, a Súmula Vinculante considera
violação da Constituição um agente público nomear cônjuge, companheiro ou
parente em linha reta, colateral (irmãos, tios, primos) ou por afinidade
(sogros, cunhados etc.), até o terceiro grau, para cargos de “direção,
chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de
confiança ou, ainda, de função gratificada na administração pública direta
e indireta em qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios”.
Marido
No processo, julgou-se improcedente o pedido para invalidar a Portaria
n. 14/2017, do TJPR, por meio da qual a administração da Justiça
paranaense impediu que o cidadão Fernando Pereira Moutinho, autor do PCA,
continuasse a responder pelo Cartório de Registro de Imóveis de Barbosa
Ferraz, comarca localizada no noroeste do Estado.
O cartório ficara vago quando sua esposa, a então titular do cartório, foi
aprovada para ser removida e assumiu o 1º Registro de Imóveis de Pato
Branco, no sudoeste do Paraná. Escrevente mais antigo do cartório,
Moutinho foi então nomeado pela esposa como interino do cartório.
A Corregedoria Geral da Justiça do TJPR, no entanto, revogou sua nomeação.
Moutinho recorreu ao CNJ. O então conselheiro Carlos Levenhagen concedeu
liminar em junho de 2017 para manter a nomeação interina de Moutinho até a
decisão do mérito.
Em 1º de agosto de 2017, o Plenário ratificou a liminar. No entanto, a
partir de setembro do ano passado, o CNJ mudou seu entendimento acerca da
questão. A conselheira relatora do processo, Iracema do Vale, relembrou
dois precedentes, relatados pelos conselheiros Fernando Mattos e Gustavo
Alkmim.
Na sessão de terça-feira (3/4), no julgamento do mérito do processo, todos
os conselheiros presentes à 269ª Sessão Ordinária entenderam que houve
nepotismo. Com a decisão, volta a valer o veredito do TJPR sobre o caso.
“A sucessão de parentes à testa de serviço registral contraria igualmente
o princípio republicano por causar a perpetuação de uma pessoa ou grupo de
pessoas (núcleo familiar) no exercício de atividades do Estado sem
privilegiar, contudo, a alternância e a temporariedade”, afirmou no seu
voto a conselheira relatora do processo, Iracema do Vale.
Filha
No segundo caso, Aline Mallmann Dorneles, filha da antiga responsável
pelos serviços de cartório prestados em Nova Santa Rita/RS, pedia para
suceder a mãe por ser a funcionária mais velha do cartório. Maria Gislaine
Mury Mallmann, mãe de Aline, fora afastada devido a irregularidades
verificadas durante inspeção da Corregedoria Geral da Justiça do Tribunal
de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), até ser condenada em processo
administrativo disciplinar e perder definitivamente a delegação dos
serviços cartoriais.
Com a saída da antiga titular do cartório, o Foro da Comarca de Canoas
nomeou outra pessoa para o posto, na condição de interventora, até que um
novo concurso seja realizado para aprovar o novo responsável pelo órgão. A
conselheira relatora do processo, Maria Tereza Uille, deu razão à
administração do tribunal ao arquivar o processo em setembro de 2017.
“Os Tribunais detêm autonomia para apreciar a legalidade de seus próprios
atos (artigo 96, I, CF) e, no caso dos autos, assim o fez por entender que
a designação de Aline Mallmann Dornelles Stiffel para responder pelos
serviços colocaria em xeque a credibilidade da fé pública”, afirmou em seu
voto.
Aline Mallmann recorreu e nesta terça-feira (3/4) o Plenário seguiu o voto
da relatora do processo ao negar provimento ao recurso. Presidente Segundo
a presidente do CNJ e do STF, ministra Cármen Lúcia, as disputas por
titularidade de serviços cartoriais sobrecarregam os dois órgãos do Poder
Judiciário, embora as regras para assumir os cartórios tenham sido fixadas
há 30 anos, na Constituição de 1988.
A situação demanda uma atitude do Poder Judiciário. “O Direito brasileiro
tem um encontro marcado com esse tema. É serviço público, ou seja: serviço
prestado ao público na forma da constituição e da legislação vigente. O
artigo 37 (da Constituição) é taxativo, não há dúvida sobre isso 30 anos
depois. Não é possível burlar o princípio da impessoalidade”, afirmou.
|