Decisão/TJMG - Confirmada a aposentadoria de escrevente substituto de serventia extrajudicial

 

EMENTA: ADMINISTRATIVO - COMSTITUCIONAL - SERVENTIA EXTRAJUDICIAL - ESCREVENTE SUBSTITUTO - LEI Nº8.935/94, ART.48, §2º - OPÇÃO - NÃO MANIFESTAÇÃO - REGIME ESTATUTÁRIO - APOSENTADORIA - CÔMPUTO DE FÉRIAS PRÊMIO NÃO GOZADAS - REGRA ESTATUTÁRIA - POSSIBILIDADE - SENTENÇA CONFIRMADA

O Escrevente Substituto de serventia extrajudicial, admitido sob a égide da Constituição anterior, e submetido ao regime jurídico estatutário, enquadra-se na categoria de servidor público em sentido amplo, sendo legítimo o ato que lhe concede a aposentadoria com o cômputo do tempo das férias prêmio não gozadas.

REEXAME NECESSÁRIO-CV Nº 1.0024.12.135573-9/002 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - REMETENTE.: JD 1 V FAZ COMARCA BELO HORIZONTE - AUTOR(ES)(A)S: EDA LUCIA RODRIGUES - RÉ(U)(S): ESTADO DE MINAS GERAIS

A C Ó R D Ã O

Vistos etc., acorda, em Turma, a 3ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, à unanimidade, em confirmar a sentença, em reexame necessário.

DES. KILDARE CARVALHO

RELATOR.

DES. KILDARE CARVALHO (RELATOR)

V O T O

Trato de reexame necessário da r. sentença (fl.731/737-TJ) proferida pela MMª. Juíza da 1ª Vara da Fazenda Pública da comarca de Belo Horizonte que, nos autos da ação ordinária anulatória de ato administrativo ajuizada por Êda Lucia Rodrigues em desfavor do Estado de Minas Gerais, julgou procedente o pedido inicial, para anular o ato administrativo que determinou a desaposentação da autora, bem como o arquivamento do processo administrativo instaurado, anulando a certidão de tempo de serviço expedida em 21/09/2012, e condenou o réu a reconhecer o tempo efetivamente trabalhado pela autora, para fins de aposentadoria, restabelecendo o benefício nos termos anteriormente concedido. Por fim, condenou o réu ao pagamento de honorários advocatícios no valor de R$ 200,00 (duzentos reais).

Não foi interposto recurso voluntário.

Manifestação da Procuradoria de Justiça à fl.745-TJ, pela desnecessidade de sua intervenção no feito.

Este o relatório.

Conheço da remessa oficial do processo, presentes os pressupostos para sua admissão.

A autora ajuizou ação anulatória de ato administrativo contra o Estado de Minas Gerais ao argumento, em síntese, de que já está aposentada, desde 01.07.2008 (fl.46-TJ), no cargo de Escrevente Juramentado Substituto do Cartório de Registro de Imóveis da comarca de Congonhas, mas que foi surpreendida com processo administrativo com o objetivo de determinar a anulação de sua aposentadoria.

O Estado de Minas Gerais em sua contestação reconheceu que o processo administrativo que determinará no ato de desaposentação da autora é legítimo, pois a Autora não poderia se valer dos critérios previstos na Lei 869/51, tal como, contagem em dobro das férias-prêmio não gozadas, para fins de aposentadoria, pois dita lei se aplica apenas aos servidores titulares de cargo efetivo.

O MM. Juiz julgou procedente o pedido ao fundamento de que a autora ingressou no serviço público antes da CR/88, razão pela qual a requerida foi abrangida pelo sistema jurídico estatutário do Estado de Minas Gerais e faz jus à contagem em dobro das férias premio não gozada, nos termos da Lei 869/52, aplicável aos servidores públicos, o que lhe possibilitou a aposentadoria com proventos proporcionais a 25 (vinte e cinco) anos de serviço.

Com efeito, extrai-se dos elementos presentes no feito que a autora foi admitida em 01/04/1978, na função de auxiliar de cartório. Em 30/12/1979 foi nomeada como Escrevente Juramentada da comarca de Congonhas e, em 01/06/1998, como Escrevente Substituta. (fl.64/70-TJ).

Verifica-se que a autora postulou a sua aposentadoria com proventos proporcionais a 25 (vinte e cinco) anos de serviço, tempo que, somado às férias prêmio não gozadas e contadas em dobro, nos termos do art. 156, § 3º, da Lei 869/52, possibilitariam o direito.

O Estado de Minas Gerais não contesta o tempo de serviço necessário para o ato, mas, por sua vez, entende que a contagem em dobro das férias prêmio seria direito exclusivo do servidor detentor de cargo efetivo, o que derruiria o direito da autora, que foi designada para o cargo de Escrevente Substituta, em junho de 1998, quando houve a desvinculação voluntária do regime estatutário, passando o serventuário a ser regido pelas normas celetistas, uma vez que já se encontrava em vigor a Lei nº 8.935/94.

Pois bem. Com efeito, a Constituição Federal de 1988, em seu art.236, estabeleceu que os serviços notariais e de registro seriam exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público, sendo que o ingresso se daria por meio de concurso público. A Lei nº 8.935, de 18/11/1994, regulamentou a atividade.

O art.32, do ADCT, estabeleceu que o disposto no art.236 não se aplicaria aos serviços notariais e de registro que já estivessem oficializados pelo Poder Público, respeitando-se o direito de seus servidores.

Como consignado pelo MM. Juiz singular, a possibilidade de concessão do direito à aposentadoria à autora é medida que se impõe na hipótese presente.

A autora, como dito alhures, pleiteia a tutela jurisdicional para aposentar-se, tendo em vista o tempo de serviço prestado ininterruptamente, desde aposentadoria junto ao Cartório de Registro de Imóveis da comarca de Congonhas, cuja admissão ocorreu em 01/04/1978, na vigência do texto constitucional anterior que oficializara as serventias extrajudiciais (Emenda Constitucional nº07/77).

Assim, como se vê, a autora foi admitida sob a égide da Constituição anterior e, no Estado de Minas Gerais, foi submetida ao regime jurídico estatutário, estando enquadrado na categoria de servidor público em sentido amplo.

Neste caso, é bem verdade que, pelas novas regras da Constituição Federal, não mais se permite a admissão de integrantes de serventia extrajudicial sob o regime estatutário, mas há que se observar que as normas anteriores permitiam, e a própria Carta Magna de 1988 assegurou expressamente o respeito aos direitos dos servidores anteriores.

Por outro lado, é certo que a Lei nº 8.935/94 dispôs nos arts. 20 e 21 sobre a liberdade de contratação e ajuste da remuneração de escreventes e auxiliares pelos notários e oficiais de registro, porém, em seu art.48, assegurou aos escreventes e auxiliares de investidura estatutária ou em regime especial, a opção de transformar o seu regime jurídico em celetista, no prazo improrrogável de trinta dias, contados da publicação da referida lei, in verbis:

"Art.48 - Os notários e os oficiais de registro poderão contratar, segundo a legislação trabalhista, seus atuais escreventes e auxiliares de investidura estatutária ou em regime especial desde que estes aceitem a transformação de seu regime jurídico, em opção expressa, no prazo improrrogável de 30 (trinta) dias, contados da publicação desta Lei.

§1º - Ocorrendo opção, o tempo de serviço prestado será integralmente considerado, para todos os efeitos de direito.

§2º - Não ocorrendo opção, os escreventes e auxiliares de investidura estatutária ou em regime especial continuarão regidos pelas normas aplicáveis aos funcionários públicos ou pelas editadas pelo Tribunal de Justiça respectivo, vedadas novas admissões por qualquer desses regimes, a partir da publicação desta Lei."

Denota-se dos elementos coligidos aos autos que a autora não formalizou a sua opção de mudança para o regime jurídico trabalhista, o que a assegurou na regência das normas aplicáveis aos funcionários públicos ou as editadas pelo Tribunal de Justiça, consoante estabelecido no §2º, do art.48, da Lei nº 8.935/94, supra-transcrito.

Com efeito, não há falar na espécie, em automática desvinculação do regime estatutário e ingresso no sistema celetista, na medida em que a legislação de regência é clara no sentido de dispor que a opção deverá se dar de forma expressa.

A meu aviso, não há como simplesmente concluir-se que a serventuária exerceu opção, ou que, com a mudança de cargo, evidencia-se sua opção. Não havendo prova contundente nos autos da opção expressa, considera-se que tal não existiu e, por conseqüência, o reconhecimento de sua permanência no regime estatutário, como preconizado pela lei, é medida que se impõe.

A respeito, Walter Ceneviva, em sua obra "Lei dos Notários e dos Registradores Comentada", Ed. Saraiva, trata da questão:

"O prazo para o exercício da opção de escreventes e auxiliares encerrou-se em dezembro de 1994. Surgiram, portanto, duas linhas concretas de regime jurídico:

a) os não-optantes mantiveram as suas anteriores condições de trabalho, distintas da relação de emprego e subordinadas ao regime estatutário ou especial, conforme a lei do Estado e do Distrito Federal, que persistirá até que fique vago o último cargo dos não-optantes, em cada serviço notarial ou registrário;

b) os optantes foram contratados no regime da Consolidação das Leis do Trabalho, submetidos à seguridade social prevista em lei federal, sendo vedadas admissões no regime antigo.

(...)

Exaurido o prazo previsto no final do artigo, tornou-se imutável a opção, tendo como conseqüência a manutenção do regime jurídico anterior, para os não-optantes, pois garantido pelo direito adquirido daqueles que assim decidiram, com amparo constitucional.".

Destarte, não se nega a discrepância entre o regime dos servidores estatutários e a organização de caráter privado, entretanto, tal situação está disposta e regulamentada em lei e a própria Constituição Federal assegurou o respeito ao direito desses servidores.

O regime jurídico dos servidores do foro extrajudicial, mesmo antes da Constituição de 1988 e da Lei nº8.935/94, já se caracterizava por ser de natureza híbrida. Eles possuíam direitos e obrigações regidos por lei, conforme os funcionários públicos, mas a remuneração paga pelo titular da serventia.

Agora, rege-se pelo direito privado a organização e estruturação do empreendimento, todavia, frise-se, a relação com a Administração é regida pelo direito público, estando incluído os integrantes da serventia que se encontravam enquadrados na categoria de servidores públicos em sentido amplo.

De tudo que foi, dito, percebe-se que o direito à aposentadoria pelo Estado de Minas Gerais é conseqüência da vinculação do recorrido ao regime estatutário e que tal liame permaneceu em virtude da não opção do serventuário pelo sistema celetista, nos moldes do §2º, do art.48, da Lei nº8.935/94.

Neste mesmo sentido, votei como Revisor, no julgamento da Apelação nº1.0024.02.676983-6/001, cujo Relator na oportunidade foi o eminente Desembargador Schalcher Ventura.

Infere-se, portanto, que a autora possui o direito à contagem em dobro das férias prêmio não gozadas para o cômputo do tempo para sua aposentadoria, uma vez que é considerada servidora pública, aplicando-lhe o regime estatutário, razão pela qual faz jus a se aposentar com o benefício previsto no art. 156, § 3°, da Lei 869/52.

Com tais considerações, em reexame necessário, confirmo integralmente a r. sentença.

Custas, ex legis.

DESA. ALBERGARIA COSTA (REVISORA)

Em juízo de revisão, conheço do reexame necessário, já que presentes os pressupostos de admissibilidade.

Cinge-se a controvérsia em verificar a legalidade do ato administrativo que determinou a desaposentação da autora, escrevente de cartório extrajudicial, sob o fundamento de não ter tempo suficiente para a aposentadoria.

Sobre o assunto, é preciso destacar, inicialmente, que é pacífico na doutrina e na jurisprudência que a concessão de benefícios previdenciários, dentre eles a aposentadoria, rege-se pela Lei vigente à época em que o beneficiário reunia as condições necessárias para a concessão do benefício, segundo o princípio do tempus regit actum. Neste sentido, já decidiu o STF1:

"Agravo regimental no recurso extraordinário. Transposição do regime celetista para o estatutário. Extinção do contrato de trabalho. Regime de aposentadoria estatutário. Decisão atacada em conformidade com o verbete da Súmula nº 359 desta Suprema Corte. 1. É pacífica a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal de que os proventos da inatividade se regulam pela lei vigente ao tempo em que reunidos os requisitos para sua concessão. 2. O servidor deve obter a aposentadoria segundo as regras vigentes do regime ao qual se submete. 3. Agravo regimental não provido."

No caso dos autos, para que pudesse se aposentar por proporcionalmente, deveria a apelante ter reunido os requisitos necessários para a sua concessão até a publicação da EC nº 19, publicada em 16/12/1998.

Até essa data, a autora contava com vinte cinco anos de tempo de serviço, contando em dobro as férias-prêmio não gozadas, já que a ela eram aplicadas as regras do regime estatutário.

Dessa forma, mesmo com o advento das alterações promovidas pela EC nº 19/98 no artigo 40 da Constituição Federal, em que a aposentadoria pelo RPPS passou expressamente a abranger apenas os "servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações", afastando do seu âmbito de alcance os escreventes dos Cartórios Extrajudiciais, a autora possui direito a aposentadoria.

Veja-se que o Decreto Estadual nº 45.172/09, que regulamentou o artigo 3º da LC nº 64/02, tratou expressamente da condição dos escreventes dos serviços notariais, dispondo da seguinte maneira:

"Art. 1º Os notários, registradores, escreventes e os auxiliares dos serviços notariais e de registro admitidos até 18 de novembro de 1994, não optantes pela contratação segundo a legislação trabalhista, nos termos do § 2º do art. 48 da Lei Federal nº 8.935, de 18 de novembro de 1994, e que tenham cumprido todos os requisitos para usufruírem de benefícios previdenciários até 16 de dezembro de 1998, data de publicação da Emenda à Constituição da República nº 20, são vinculados compulsoriamente ao Regime Próprio de Previdência e Assistência Social.

Art. 2º O cômputo do tempo de serviço para fins de aposentadoria no regime próprio de previdência estadual de que trata o art. 1º não pode ultrapassar 16 de dezembro de 1998.

Art. 3º Os escreventes e auxiliares dos serviços notariais e de registro não alcançados por este Decreto são segurados obrigatórios do Regime Geral de Previdência Social."

Isso posto, acompanho o eminente relator para, em reexame necessário, CONFIRMAR a sentença de primeiro grau.

É como voto.

DES. ELIAS CAMILO SOBRINHO - De acordo com o(a) Relator(a).

SÚMULA: "CONFIRMARAM A SENTENÇA, EM REEXAME NECESSÁRIO."

1 RE 399268 AgR/DF, DJe 06/09/2012
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Fonte: Site do SINOREG/MG - 26/05/2014
 

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