O ministro Teori Zavascki, do Supremo
Tribunal Federal (STF), negou seguimento ao Mandado de Segurança (MS)
29219, impetrado contra decisão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que
desconstituiu ato do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (TJ-RN)
autorizando a permuta, sem concurso público, entre os titulares do 2º
Ofício de Notas da Comarca de São José de Mipibú (RN) e do 2º Ofício de
Notas da Comarca de São Paulo do Potengi (RN). De acordo com o ministro, a
remoção sem concurso viola o do artigo 236, parágrafo 3º, da Constituição
Federal.
O relator observou que o serviço notarial é exercido em caráter privado e
por delegação do poder público, para cujo ingresso ou remoção exige-se
concurso público de provas e títulos. Assinalou também que a atividade
notarial e de registro é essencialmente distinta da atividade exercida
pelos poderes de Estado e, embora prestado como serviço público, o titular
da serventia extrajudicial não é servidor e com este não se confunde.
De acordo com os autos, os autores do MS ingressaram no cargo de titular
das respectivas serventias por meio de concurso público e, após sucessivas
movimentações, em 15/8/2002, foram reciprocamente removidos por permuta.
As partes argumentam que, em respeito aos princípios constitucionais da
segurança jurídica e da boa-fé, o ato do TJ-RN autorizando a permuta não
seria passível de anulação passados oito anos (a decisão do CNJ ora
atacada é de 2010), pois já teria sido consumada a decadência de que trata
o artigo 54 da Lei 9.784/1999 (Lei de Processo Administrativo). Alegam
também que a permuta estava autorizada pela Lei Complementar estadual
122/94.
O relator salientou que a legislação estabelece limites ao poder de
revisão dos atos do Poder público de que decorram efeitos favoráveis ao
administrado, passado o prazo de cinco anos da vigência de lei ou ato
normativo. Segundo ele, essa espécie de autolimitação instituída pelo
legislador tem por razão a proteção da segurança jurídica do administrado
e significa que, depois desse prazo, decai o direito de revisão, exceto
quando verificada a má-fé do beneficiário. Destacou, no entanto, que a
situação em exame no MS tem outra conformação, pois a decadência não se
sobrepõe às exigências constitucionais.
“A Constituição ordena a sujeição ao concurso público a quem não ostente
essa condição de acesso à serventia ocupada, ordem essa que não está
sujeita a prazo de qualquer natureza, não podendo cogitar de convalidação
dos atos ou fatos que persistem em descumpri-la. Não há sentido algum,
portanto, em se debater a respeito da decadência, nessas hipóteses. Em
suma, o prazo decadencial de cinco anos para revisão de atos
administrativos (artigo 54 da Lei 9.784/1999, e artigo 91, parágrafo
único, do Regimento Interno do CNJ) não se aplica a situações
inconstitucionais, como a dos autos, em que houve a delegação de serventia
extrajudicial sem a prévia realização do devido concurso público”,
argumentou.
O relator elencou decisões precedentes do Plenário nas quais ficou
assentado não haver direito adquirido à efetivação em serventia vaga
depois da Constituição de 1988, citando entre elas o MS 28273, de
relatoria do ministro Ricardo Lewandowski, em que o Plenário, por
unanimidade, decidiu que o exame da investidura na titularidade de
cartório sem concurso público não está sujeito ao prazo decadencial
previsto no artigo 54 da Lei 9.784/1999. Citou também o MS 28279, de
relatoria da ministra Ellen Gracie (aposentada), no qual foi fixado o
entendimento de que “situações flagrantemente inconstitucionais como o
provimento de serventia extrajudicial sem a devida submissão a concurso
público não podem e não devem ser superadas pela simples incidência do que
dispõe o artigo 54 da Lei 9.784/1999, sob pena de subversão das
determinações insertas na Constituição Federal”.
O ministro apontou que o requisito constitucional do concurso público é
inafastável em ambas as hipóteses de delegação de serventias
extrajudiciais e sem a incidência de prazo decadencial: no ingresso,
exige-se o concurso público de provas e títulos; na remoção, concurso de
títulos.
O ministro ressaltou que a alegação de que remoções foram efetivadas com
amparo na Lei Complementar estadual 122/1994, que dispõe sobre “o regime
jurídico único dos servidores públicos civis do Estado e das autarquias e
fundações públicas estaduais” também é improcedente, pois a norma
apresenta conteúdo direcionado aos servidores do Poder Judiciário, e não
aos ocupantes das serventias extrajudiciais. Destacou que não ficou
evidenciado nos autos que a remoção foi antecedida de procedimento
administrativo que assegurasse a impessoalidade e a igualdade de condições
entre os inscritos, o que representa violação do artigo 236, parágrafo 3º,
da Constituição.
“Em suma, não se tem presente a alegada ilegitimidade do ato coator
atribuído ao Conselho Nacional de Justiça nem a existência do direito
líquido e certo afirmado pelos impetrantes”, concluiu o ministro ao
revogar a liminar deferida pelo relator anterior, ministro Ayres Britto
(aposentado), e negar seguimento (julgar inviável) ao mandado de
segurança.
Processos relacionados:
MS 29219
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