Graciano Pinheiro de
Siqueira
(Oficial substituto do 4º Títulos e Documentos e Pessoa Jurídica da
Capital de São Paulo e é especializado em Direito Comercial, pela
Faculdade de Direito da USP).
Segundo o Prof. Fábio Ulhoa
Coelho, há alguns instrumentos cedulares representativos de crédito
decorrente de financiamento aberto por uma instituição financeira. Se
houver garantia de direito real do pagamento do valor financiado, por
parte do mutuário, esta garantia é constituída no próprio título,
independentemente de qualquer outro instrumento jurídico. Os títulos de
financiamento são, também, importante meios de incremento de atividades
econômicas, sendo também utilizados para financiamento da aquisição da
casa própria.
Tais títulos costumam chamar-se "Cédula de Crédito" quando o pagamento do
financiamento a que se referem é garantido por hipoteca, penhor ou
alienação fiduciária. Inexistindo garantia de direito real como as acima
mencionadas, o título é, comumente, denominado "Nota de Crédito".
Nesta categoria de títulos de crédito se enquadram: a Cédula e Nota de
Crédito Rural (Dec.-lei nº 167, de 1967), relacionados com o financiamento
das atividades agrícolas e pecuárias; a Cédula e Nota de Crédito
Industrial (criadas pelo Dec.-lei nº 413, de 1969), referentes ao
financiamento da indústria; a Cédula e Nota de Crédito Comercial (Lei nº
6.840, de 1980), destinadas ao financiamento de atividade comercial ou de
prestação de serviços; a Cédula e Nota de Crédito à Exportação (Lei nº
6.313, de 1975), pertinentes ao financiamento da produção de bens para a
exportação, da própria exportação e de atividades complementares; a Cédula
Hipotecária (Dec.-lei nº 70, de 1966), destinada ao financiamento da casa
própria pelo Sistema Financeiro da Habitação; e a Cédula de Produto Rural
– CPR (Lei nº 8.929, de 1.994), representativa de promessa de entrega de
produtos rurais, com ou sem garantia cedularmente constituída.
Os títulos de financiamento não se enquadram, completamente, no regime
jurídico-cambial (daí estarem enquadrados na categoria de títulos
impróprios) por força de algumas peculiaridades, como a possibilidade de
endosso parcial, mas, principalmente, em razão do princípio da
cedularidade, estranho ao direito cambiário. Por este princípio, a
constituição dos direitos reais de garantia se faz no próprio instrumento
de crédito, na própria Cédula.
A Cédula de Crédito Comercial, embora não elencada, expressamente, no rol
dos atos sujeitos a registro perante o Registro de Imóveis, na lei
específica sobre registros públicos (Lei nº 6015/73), deve nele estar
inscrita, no Livro 3, já que, segundo dispõe o art. 5º da Lei nº 6.840, de
3 de novembro de 1.980, "aplicam-se à Cédula de Crédito Comercial e à Nota
de Crédito Comercial as normas do Dec.-lei n. 413, de 9 de janeiro de
1969, inclusive quanto aos modelos anexos àquele diploma, respeitadas, em
cada caso a respectiva denominação e as disposições desta lei".
Por esta razão, as Normas de Serviço dos Cartórios Extrajudiciais - Tomo
II, criadas pela Egrégia Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo,
completando o disposto no art. 167, I, 14, da citada Lei nº 6.015/73 (LRP),
estabelecem, dentre as atribuições do Registro de Imóveis, o registro de
cédulas de crédito industrial, à exportação e comercial (Livro 3),
conforme disposto no Capítulo XX, Seção I, item 1., a),14), bem como na
Seção II, item 70, b, das referidas Normas de Serviço.
Não obstante, não se pode deixar de ter em vista que o art. 129, 5º) da
referida lei dos registros públicos, estabelece que estão sujeitos a
registro, no registro de títulos e documentos, para surtir efeitos em
relação a terceiros, os contratos de compra e venda em prestações, com
reserva de domínio ou não, qualquer que seja a forma de que se revistam,
os de alienação ou de promessas de venda referentes a bens móveis e os de
alienação fiduciária.
Assim sendo, as cédulas de crédito comercial serão registradas no Registro
de Imóveis e, a nosso ver, quando houver garantia constituída em alienação
fiduciária de coisa móvel, também no Registro de Títulos e Documentos.
Nessa hipótese, a eficácia do ato depende da duplicidade do registro em
serventias diversas, por imposição legal. Admitida que fosse a
desnecessidade de registro em dois cartórios e a publicidade suficiente em
um só deles, ter-se-ia de afirmar a inocuidade da disposição, o que
contraria o sistema.
Evidentemente, se a garantia constituída em alienação fiduciária tiver
como objeto coisa imóvel, a competência de registro será do registro
predial, "ex vi" do disposto no art. 167, I, 35) da Lei nº 6.015/73.
Em relação à Cédula de Produto Rural a orientação é exatamente a mesma da
cédula de crédito comercial. Registra-se perante o registro imobiliário
competente, de acordo, inclusive, com o disposto no art. 12 da Lei nº
8929/94, pois, "a CPR, para ter eficácia contra terceiros, inscreve-se no
Cartório de Registro de Imóveis do domicílio do emitente".
Nos termos do art. 5º da citada lei, a garantia cedular da obrigação
poderá consistir em: I- hipoteca; II- penhor; e, III- alienação
fiduciária. Se a garantia constituída em alienação fiduciária for bem
móvel, também se fará necessário o registro em títulos e documentos. Sendo
imóvel o bem dado em garantia, competente para o registro será o Registro
de Imóveis.
A propósito, sobre a matéria, o CDT-Centro de Estudos e Distribuição de
Títulos e Documentos de São Paulo lavrou o seguinte enunciado: "Nos
instrumentos em que houver garantia real imobiliária e outra(s)
garantia(s) sujeita(s) a registro em TD, este será realizado, independente
de prévio registro em RIou de ordem de registro".
Cabe, finalmente, lembrar que, em recente entrevista concedida à TV
Justiça, o Dr. Narciso Orlandi Neto, conselheiro jurídico do IRIB, fez
comentários sobre as disposições do novo Código Civil atinentes ao
registro de imóveis. Naquela oportunidade, dentre as várias questões
suscitadas, uma era exatamente a seguinte: "O Registro de Títulos e
Documentos, por suas características, não seria o destinatário natural dos
direitos pessoais e reais sobre as coisas móveis? Por que a opção pelo
Registro de Imóveis?". Em resposta, o ex-Desembargador do Tribunal de
Justiça de São Paulo, assim se pronunciou: "Sim, o Registro de Títulos e
Documentos, entre outras finalidades, destina-se aos direitos reais
mobiliários, mas o legislador tem dado preferência ao Registro de Imóveis
por causa da força de sua publicidade. O Registro de Imóveis possui
característica que os outros não têm, que é a territoriedade. O Registro
de Imóveis é a única repartição que disponibiliza informação sobre um
determinado imóvel. Essa publicidade é mais efetiva do que a publicidade
de várias repartições que têm competências concorrentes. Em relação aos
direitos reais mobiliários, como o penhor de uma máquina aplicada na
indústria, por exemplo, o gerente do banco concede o financiamento e
recebe como garantia a própria máquina.
No Registro de Imóveis do local em que se situa a empresa é possível saber
se aquela máquina já foi objeto de penhor. Tornando o registro do contrato
obrigatório e encaminhando-o ao Registro Imobiliário, o legislador
disponibiliza a informação. Daí a preferência pelo Registro de Imóveis".
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