O prazo de adaptação das
empresas ao novo Código Civil acabou sendo adiado para 2005, mas a pressa
para adequar-se até os primeiros dias deste ano acabou levando algumas
empresas a tomar decisões erradas. No interior paulista, diversos
prestadores de serviço que eram registrados como sociedades civis
decidiram inscrever-se na Junta Comercial como sociedades empresárias.
Como resultado, podem perder liminares que garantem isenção da
Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e estão na
mira da prefeitura, que pode passar a recolher o Imposto sobre Serviços
(ISS) segundo o faturamento.
O novo código extinguiu a figura da sociedade civil e instituiu a
sociedade simples, que seria uma espécie de substituto à figura anterior.
Mas as diferenças não estavam claras para muitos profissionais, que
acabaram tomando uma decisão pouco acertada. Especialistas admitem que a
legislação é confusa e que não é tão simples fazer a escolha certa. O caso
ocorrido no Estado de São Paulo chama a atenção para problemas que podem
surgir devido à adaptação recente ao novo Código Civil.
Mais de metade dos 40 escritórios de contabilidade e várias clínicas
médicas de Itu, no interior de São Paulo, fizeram a adaptação na Junta
Comercial como sociedades empresárias. O registro com a nova natureza
jurídica não teria graves conseqüências de imediato, não fosse o fato de a
alteração ter implicações tributárias. A mudança põe em risco regimes
especiais de recolhimento de ISS e Cofins que são assegurados às
sociedades civis. Os benefícios seriam mantidos apenas se elas fossem
registradas como sociedades simples.
Todos os escritórios de contabilidade e várias das clínicas médicas da
cidade estão com ações na Justiça pedido a isenção da Cofins, algumas já
com liminares. A legislação e a jurisprudência que dão sustentação à tese
da isenção da Cofins garantem o regime apenas às sociedades civis de
prestadores de serviço. Segundo Rodrigo Bley, do escritório Ogusuku & Bley
Advogados, que obteve liminares isentando cerca de 30 prestadores de
serviço de Itu, quem mudou para sociedade empresária corre perigo de
perder a isenção caso a procuradoria da Receita Federal questione as
decisões dada o novo status dos contribuintes. A orientação para os
clientes agora é voltar atrás e refazer o registro como sociedade simples.
Para quem ainda não obteve decisão, o melhor é parar o processo e alterar
o registro antes que haja julgamento.
Outro problema é com o ISS. Em algumas cidades foi instituída legislação
que define a incidência do ISS segundo um valor fixo para as sociedades
civis de prestadores de serviço, o que abre possibilidade de cobrar de
quem mudou a natureza jurídica. Segundo Bley, em Itu, houve acordo com o
prefeito, revertendo o entendimento da fiscalização da prefeitura, que
estava tributando a receita dos prestadores de serviço sob a alegação de
que a natureza jurídica estava alterada. Segundo Bley, em Sorocaba, cidade
próxima a Itu, estaria ocorrendo situação semelhante.
Walter Conceição, diretor jurídico do Conselho Regional de Contabilidade
do Rio de Janeiro, afirma que alguns escritórios de contabilidade da
cidade estavam pensando em mudar de sociedades civis para sociedades
empresárias devido à adaptação ao novo Código Civil. A mudança foi
desaconselhado pelo advogado. Uma das alegações dos contadores, diz
Conceição, era que as sociedades simples supostamente implicariam
responsabilidade ilimitada do capital dos sócios.
A advogada Tânia Liberman, do Koury Lopes Advogados, avalia que a
adaptação ao novo código deixou muitas pessoas confusas, pois a sociedade
simples é uma figura jurídica que não existia até então. Para muitos,
poderia aparentar ser uma melhor opção passar para sociedade empresária,
já conhecida, devido à aplicação subsidiária das regras da sociedade
limitada, já existentes no Código Comercial. No caso da responsabilidade
dos sócios, não haveria porque se preocupar com a sociedade simples, pois
foi criada a nova figura da sociedade simples limitada, que faz as vezes
da antiga figura da sociedade civil por cotas.
A advogada Taís Cordero, do Trevisioli Advogados Associados, teve dois
clientes que pediram parecer sobre a adaptação ao novo Código, devido à
dúvida se convinha o registro como sociedade empresária ou se como
sociedade simples. Segundo a advogada, o que determina a diferença é a
organização do trabalho na sociedade. Uma grande empresa, com divisão do
trabalho mais complexa, onde os sócios são apenas administradores, deve
ter registro como sociedade empresária. Na dúvida, um dos clientes
preferiu postergar a adaptação, aproveitando que foi adiado o prazo até
2005.
Condensado da reportagem de Fernando Teixeira para Valor on Line de 9 de
março.
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