Grupo de candidatos aponta
irregularidades na correção das provas aplicadas em agosto pelo Tribunal
de Justiça de Minas Gerais para preencher 468 vagas em cartórios do estado
Isabella Souto
Elogios à caligrafia, notas rasuradas sem assinatura do examinador, erros
comuns apontados em algumas provas e ignorados em outras, nota máxima para
um candidato que se identificou na prova. Essas são apenas algumas das
supostas irregularidades cometidas na prova escrita do último concurso
aberto pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) para preencher 468
vagas em cartórios de todo o estado – 312 delas para ingresso e 16 para
remoção. O teste foi aplicado em 6 e 7 de agosto e já é alvo de um
procedimento de controle administrativo (PCA) instaurado no Conselho
Nacional de Justiça (CNJ) e assinado por 27 dos 2.701 candidatos às vagas.
Com o PCA de 79 páginas foram encaminhadas cópias de trechos de várias
provas que mostrariam suposto favorecimento na correção. Um candidato que
recebeu nota máxima em uma das questões recebeu um delicado elogio de quem
corrigiu sua prova: “Bela letra, parabéns”. “Essa atitude infantil é
incompatível com o profissionalismo e a seriedade que se espera de um
examinador de concurso público”, alega o grupo, que reúne pessoas de
vários estados.
Embora o edital não preveja a possibilidade de recurso da correção da
prova escrita, um candidato teve aumento de 0,3 na nota da peça prática,
que passou de 2,70 para 3,0. O novo resultado foi publicado em 13 de
setembro no Diário do Judiciário, com a justificativa de “erro material”.
“Como pode a nota de um candidato ser aumentada gratuitamente dessa
forma?”, indagam os concorrentes. Outra questão que chama a atenção é a
rasura em várias notas, sem a assinatura do examinador, o que poderia
levantar suspeita sobre quem trocou o resultado. Isso porque, em alguns
casos, houve a rubrica do responsável pela correção.
Comparando os resultados das provas objetiva (primeira etapa, de 100
questões fechadas, onde o candidato escolhe a resposta que julga correta
entre quatro alternativas) e escrita, houve uma grande diferença na
colocação dos aprovados, o que levou a suspeitas ainda maiores. Para se
ter uma ideia, o primeiro colocado na primeira etapa do concurso ficou em
937º na segunda. Entre os 40 primeiros, o mais bem colocado foi o 31º, que
obteve a 42ª maior nota na segunda etapa. O candidato que obteve a
colocação 27 na prova fechada foi classificado em 1.249º depois de passar
pela prova escrita. Já aquele que ficou em 1.249º na prova objetiva
conseguiu chegar à 3ª colocação na prova aberta.
Foi essa discrepância no resultado que chamou ainda mais a atenção do
procurador do grupo que assina o PAC, o funcionário público da Prefeitura
do Recife, Fernando Ribeiro da Cunha, que obteve na internet dados dos
outros candidatos. Ele ficou em 20º lugar na primeira etapa e terminou em
1.128º na segunda. “Nós não estamos trabalhando com a hipótese de fraude.
A palavra fraude contém a ideia de dolo, de intenção de violar a lei. O
que constatamos foi desleixo, desídia, uma correção de prova feita às
pressas e de qualquer jeito”, lamenta o candidato.Nessa quarta-feira ,
chegou ao Tribunal de Justiça notificação para prestar informações no
prazo de 15 dias. Segundo a assessoria de imprensa, o órgão só iria se
manifestar depois de avaliar o documento.
Liminar
Um grupo de outros cinco candidatos ao concurso também vai recorrer ao
CNJ. Até a semana que vem o advogado Marcelo Lobato encaminhará um pedido
de providências. “São etapas e provas diferentes, mas não é possível que
alguém que foi tão bem na prova objetiva ter se saído tão mal nas questões
abertas. Alguma coisa está acontecendo”, argumenta Lobato. Ele salienta
ainda que uma análise da correção de várias provas mostra que alguns
candidatos foram penalizados por erros cometidos também por concorrentes
que não tiveram desconto semelhante na nota. Um exemplo é a falta da
qualificação de testemunhas na questão que pedia a elaboração de um
testamento. Enquanto alguns perderam pontos, um candidato que cometeu a
mesma falha recebeu nota máxima.
No pedido de providências que encaminhará ao CNJ, o advogado solicitará a
concessão de liminar para suspender a terceira etapa da prova, marcada
para 9 a 25 de janeiro na modalidade oral e para a qual foram
classificados 1.710 candidatos. Se o CNJ comprovar que houve favorecimento
a algum, o concurso será anulado e todas as modalidades terão que ser
repetidas. Foram inscritos para a seleção 5.977 bacharéis em direito ou
quem comprovou exercício da função em serviço notarial ou de registro por
10 anos, completados até a data da primeira publicação do edital do
concurso. Não há um salário fixo: o titular embolsa tudo que sobrar da
arrecadação do cartório depois de repassar ao estado todas as taxas
legais.
Férias no TJ
Os ministros do Supremo Tribunal Federal optaram por adiar o julgamento da
ação que trata das férias de 60 dias anuais dos mais de 2 mil servidores
da 2ª instância do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG). Estava na
pauta de dessa quarta-feira um mandado de segurança contra decisão do
Conselho Nacional de Justiça (CNJ), tomada há quatro anos, derrubando o
benefício que existe apenas no TJ mineiro. A recomendação, no entanto,
nunca foi colocada em prática porque o sindicato que representa a
categoria conseguiu na Justiça uma liminar suspendendo a aplicação. Os
servidores questionam na ação a legitimidade do CNJ para deliberar sobre
as suas férias. |