Fora dos tribunais, número de inventários e divórcios cresce

 

A lei que permite aos brasileiros fazer inventários, divórcios e partilhas de bens consensuais em cartórios completa seu primeiro de existência tendo facilitado a vida de muita gente. “Contrariando a tradição no Brasil, essa lei pegou e está funcionando”, diz o presidente da Associação dos Notários e Registradores do Brasil (Anoreg), Rogério Bacellar.

Desde janeiro de 2007, estes processos – desde que não haja menores de idade envolvidos – deixaram de lotar ainda mais os tribunais e passaram a ser resolvidos em cartório. A agilidade fez triplicar em Curitiba durante o ano passado o número de escrituras de inventários e aumentou em 45% as de rompimentos e reconciliações. “A lei é um sucesso porque facilitou a vida da população. Tivemos um grande número de divórcios porque muitas pessoas já estavam separadas de fato e agora se sentiram mais à vontade para oficializar a situação”, afirma o presidente da Anoreg.

Conheça o texto da lei
As partes envolvidas não precisam mais enfrentar a burocracia da esfera judicial. Isso significa economia de tempo e dinheiro para os participantes do processo. Um divórcio amigável feito nas varas de Família levava até dois meses para ser concluído. No cartório, pode ser feito no mesmo dia. Para os inventários sem envolvimentos de bens eram necessários vários meses até a decisão final da justiça. Com a nova lei, em até 40 dias é lavrada a escritura. As custas caíram quase 50%.

Consenso

Uma pesquisa da Fundação Getúlio Vargas e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revelou que o Poder Judiciário realizou em 2005 cerca de 260 mil separações, divórcios e inventários, sendo 70% de forma consensual – casos que, pela nova regra, poderiam ser resolvidos pelos tabeliães.

Facilidade e rapidez

O administrador de empresas Alexis Rafailov se divorciou depois de 23 anos de casamento. Com informações de amigos, ele soube que poderia fazer o processo em um cartório. “Foi uma experiência de meia hora”, comenta ele.

Pai de dois filhos, Rafailov conta que já passou por um processo de separação na família. “A separação de meus pais foi litigiosa e não foi nada fácil. No meu caso, eu e minha ex-mulher fizemos a minuta. O advogado não teve nenhum trabalho. Houve consenso.”

Ele diz que a agilidade é muito positiva. “A velocidade com que a coisa acontece é melhor para todos. Meus filhos não concordam com a separação, mas respeitam.”

O advogado Ubiratan de Mattos se beneficiou da nova lei em um caso de inventário. Quando o avô morreu, a família não abriu um processo de partilha, mas agora que sua avó também faleceu, os herdeiros tiveram de dar andamento a dois inventários ao mesmo tempo.

Mattos não pôde cuidar do processo da família. Ele teve de contratar outro profissional porque a lei impede que o representante dos herdeiros seja o advogado no mesmo processo. “A grande vantagem é que a máquina do Judiciário não é acionada. A lei é boa e já está gerando frutos melhores. O processo vai durar uns 30 dias e essa agilidade beneficia a todos.”O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) estima que os tribunais recebiam 25 milhões de novos processos ao ano e que 2% deste total são casos que se encaixam na lei 11.441. O CNJ calcula uma economia de R$ 100 milhões para o Judiciário.

“No início tivemos algumas dificuldades em relação ao que poderia ou não ser feito. Algumas questões tiveram de ser normatizadas pela Corregedoria-Geral do Paraná”, comenta o escrevente Paulo Henrique Brisola de Mello. “Por exemplo, no caso do inventário, o valor do imposto deve ser recolhido antes da lavratura da escritura e depois encaminhado para a Receita Estadual. O laudo é liberado em até 20 dias e em 40 dias tudo está assinado”, diz ele.

A lei conferiu mais reponsabilidade para os cartorários, uma vez que eles passaram a atuar como mediadores e notificadores de todas as partes envolvidas. Em um processo de divórcio, por exemplo, o ritual se parece muito com a audiência judicial e o tabelião tem a obrigação de ratificar a decisão do casal e lembrar que pode haver reconciliação. “Quando você casa, vai a um cartório; agora, quando separa, também. Essa era uma luta de mais de 50 anos da classe”, afirma o presidente da Anoreg-PR, João Manoel de Oliveira Franco. “Partindo do conceito de que as partes, sendo maiores e capazes, têm autonomia e responsabilidade sobre seus atos, elas não precisam da tutela jurisdicional para homologar a sua vontade. A propósito, isso já é assim na maioria dos países, onde o Poder Judiciário é acionado somente nos casos onde deve julgar conflitos entre as partes”, afirma.

Presença obrigatória

O texto da lei é claro ao mencionar a obrigatoriedade do acompanhamento de um advogado durante todo o processo para que o trâmite correto seja garantido. “Com isso, o diálogo entre advogados e cartorários ficou fortalecido”, diz a advogada Ana Cecília Parodi. “O cartório passou a instrumentalizar o processo. Tínhamos uma preocupação de que a ética fosse rompida e os cartorários passassem a indicar advogados. Mas isso não aconteceu e passamos a ter uma relação de mais diálogo”, afirma.

Ana Cecília lembra ainda que a nova lei pode amenizar casos menos comuns. “Nas relações homossexuais estáveis, a partilha de bens pode também ser feita em cartório, desde que haja consenso e seja provada a estabilidade. Deixa de haver debate jurídico sobre essa relação.”

A advogada acredita que o procedimento é uma conquista. “Todos saem ganhando. A lei incentiva o consenso entre as partes. Em um caso de divórcio, há menos sofrimento e mais respeito”, opina.

A Regra do Jogo

Conheça o texto da Lei 11.441/2007

Art. 982. Havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á ao inventário judicial; se todos forem capazes e concordes, poderá fazer-se o inventário e a partilha por escritura pública, a qual constituirá título hábil para o registro imobiliário.

Parágrafo único - O tabelião somente lavrará a escritura pública se todas as partes interessadas estiverem assistidas por advogado comum ou advogados de cada uma delas, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial.

Art. 1.124 - A separação consensual e o divórcio consensual, não havendo filhos menores ou incapazes do casal e observados os requisitos legais quanto aos prazos, poderão ser realizados por escritura pública, da qual constarão as disposições relativas à descrição e à partilha dos bens comuns e à pensão alimentícia e, ainda, ao acordo quanto à retomada pelo cônjuge de seu nome de solteiro ou à manutenção do nome adotado quando se deu o casamento.

§ 1º - A escritura não depende de homologação judicial e constitui título hábil para o registro civil e o registro de imóveis.

Custos médios dos inventários feitos em cartório

Sem partilha de bens R$ 66,15

Valor máximo, com partilha de bens R$ 522,06

Custo na esfera judicial R$ 609,00

Jornal Gazeta do Povo - PR

 

Fonte: Site da ANOREG/BR - 10/01/2008
 

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