APELAÇÃO CÍVEL - NOTAS PROMISSÓRIAS DADAS
EM GARANTIA A CONTRATO DE FACTORING - NÃO DEMONSTRAÇÃO - GARANTIA DO
NEGÓCIO JURÍDICO QUE ORIGINOU O TÍTULO DE CRÉDITO OBJETO DO CONTRATO DE
FACTORING - POSSIBILIDADE
- Na área de fomento mercantil, a empresa de factoring adquire o direito
de agir em nome próprio, na cobrança das dívidas do comprador das
mercadorias, assumindo o risco sobre o recebimento dos valores
representados pelo título.
- A empresa de factoring possui direito de ação contra o faturizado
(cedente do crédito) somente se a dívida cedida estiver eivada de vício
que a invalide.
- São válidos as cambiais emitidas como garantia dos títulos de crédito
objeto do contrato de faturização, uma vez que garantem a validade dos
títulos e não o contrato em si.
Recurso não provido.
Apelação Cível n° 1.0245.06.086397-5/001 - Comarca de Santa Luzia -
Apelante: Minas Papel Indústria de Artefatos Ltda. - Apelada: Magyrus
Fomento Mercantil Ltda. - Relatora: Des.ª Electra Benevides
A C Ó R D Ã O
Vistos etc., acorda, em Turma, a 10ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça
do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na
conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à
unanimidade de votos, em negar provimento.
Belo Horizonte, 25 de agosto de 2009. - Electra Benevides - Relatora.
N O T A S T A Q U I G R Á F I C A S
DES.ª ELECTRA BENEVIDES - Trata-se de recurso de apelação interposto em
face da sentença de f. 200/206, lançada nestes autos da ação anulatória
de título aforada por Minas Papel Indústria de Artefatos Ltda. em face
de Magyrus Fomento Mercantil Ltda., decisão esta que julgou improcedente
o pedido inicial, nos seguintes termos:
``Sob tais fundamentos, entendo que constitui exercício regular de
direito o protesto, pela requerida, de notas promissórias emitidas pela
autora em substituição a duplicatas impagas, em razão de vício e
devolução de mercadorias que lhes serviram de causa.
Destarte, a improcedência da ação cautelar e da ação principal é medida
que se impõe.
Isso posto e considerando tudo o mais que dos autos consta, julgo
improcedentes os pedidos contidos na Ação Cautelar nº 245.06.085602-9 e
na ação principal 245.06.086397-5, e revogo a liminar deferia às f.
26/27 da ação cautelar'' (f. 206).
E ainda:
``condenou a autora ao pagamento das custas processuais, honorários
periciais e honorários advocatícios arbitrados em 15% (quinze por cento)
do valor atribuído à causa, devidamente atualizado''.
Inconformada com a decisão retromencionada, apela a autora, alegando que
a sentença ora guerreada não merece subsistir, uma vez que não procedeu
à correta subsunção do fato à norma (f. 207/211).
Relata que:
``a r. sentença deve ser reformada, uma vez que é inadmissível o direito
de regresso no contrato de factoring. Deveria, assim, a apelada arcar
com o risco do negócio'' (f. 208).
Informa que as cambiais levadas a protesto foram emitidas em branco para
garantir as operações de factoring, portanto de maneira irregular.
Expõe que as cambiais retratam valor superior ao que foi facturizado.
Ao final, requer seja o recurso conhecido e provido para reformar a
decisão monocrática, julgando-se procedente o pedido inicial.
Contrarrazões pelo desprovimento do apelo, refutando as alegações da
recorrente (f. 214/216).
É o relatório.
Satisfeitos os pressupostos de admissibilidade, especialmente a
tempestividade, recebo o recurso.
Trata-se de ação anulatória ajuizada pela empresa emitente das notas
promissórias levadas a protesto, alegando a nulidade dos referidos
títulos ao fundamento de que os mesmo foram emitidos de maneira
irregular, ou seja, para, indevidamente, garantir contrato de factoring.
Consoante se depreende das provas carreadas aos autos, as notas
promissórias objeto da ação anulatória foram emitidas com o intuito de
substituir e/ou garantir duplicatas que haviam sido entregues à apelada
em uma operação de factoring.
Nesse sentido, cumpre analisar a validade dos referidos títulos e,
consequentemente, a possibilidade de cobrança da dívida por eles
representada, por parte da empresa de factoring.
Conforme dilucida César Fiúza (FIUZA, César. Direito civil - curso
completo. 10. ed. Belo Horizonte: Editora Del Rey, 2007, p. 694/695):
``No factoring, uma pessoa, o faturizado, entrega à outra, o faturizador,
um título emitido por terceiro. Este título pode ser, por exemplo uma
duplicata, representativa de uma venda a prazo feita pelo faturizado.
Este, necessitando de capital de giro e não podendo esperar o vencimento
da duplicata para receber do comprador, entrega-a ao faturizador. O
faturizador, por sua vez, torna-se o novo credor do título, pagando ao
faturizado, com uma comissão, é óbvio, para depois receber do comprador
(devedor do título), na data do vencimento''.
No fomento mercantil, área de atuação da apelada, a empresa de factoring
adquire o direito de agir em nome próprio, na cobrança das dívidas
representadas pelos títulos emitidos por terceira pessoa, assumindo o
risco sobre o recebimento dos valores representados pelo título.
Assim, possui a empresa de factoring (faturizadora) direito de ação
contra o faturizado (cedente do crédito) somente se a dívida cedida
estiver eivada de vício que a invalide, o que é o caso dos autos.
Isto é, por via de regra, a faturizadora possui direito de crédito junto
ao cliente da empresa cedente (A apelante, então facturizada, só se
reponsabiliza pela existência do crédito, não pela solvabilidade do
devedor.), e não diretamente contra esta (faturizado), uma vez que o
risco do recebimento da dívida é suportado pela faturizadora por tratar
o contrato de factoring de uma verdadeira cessão de crédito.
Questão que se tornou incontroversa, uma vez que não impugnada pela
apelante, foi o fato de as duplicatas haverem sido destituídas, já que
as mercadorias foram devolvidas pelas empresas adquirentes (relação
jurídica existente entre a apelante e as empresas adquirentes das
mercadorias).
Logo, deve a apelante arcar com as consequências do seu inadimplemento
contratual, uma vez que a dívida cedida está eivada por vício que a
invalida, qual seja ausência de compra e venda mercantil, pois as
mercadorias foram devolvidas, ocasionando a invalidação das duplicadas
adquiridas pela apelada.
Assim, as notas promissórias estão a garantir não o contrato de
factoring, mas sim o negócio jurídico que originou as duplicatas objeto
do contrato. Portanto, não há que se falar em desnaturação do contrato
em questão.
Ante o exposto e por tudo mais que dos autos consta, nego provimento ao
recurso de apelação aviado, mantendo inalterada a decisão monocrática.
Custas, pela apelante.
Votaram de acordo com a Relatora os Desembargadores Gutemberg da Mota e
Silva e Alberto Aluízio Pacheco de Andrade.
Súmula - NEGARAM PROVIMENTO.