O Tribunal de Minas Gerais (TJMG) condenou a
tabeliã H.H.R.M. a indenizar a trabalhadora rural A.A.O., de Nova Rezende,
por ter emitido uma escritura pública falsa, na qual a mulher renunciava à
guarda dos quatro filhos. Por decisão da 14ª Câmara Cível, a mãe e as
crianças receberão o valor de R$ 9.300 pelos danos morais.
A.A.O., de 32 anos, conta que foi surpreendida por uma medida de busca e
apreensão proposta por suas cunhadas, que pretendiam retirar-lhe as
crianças sob a alegação de que elas estariam sendo vítimas de maus tratos.
A mãe teria praticado atos de crueldade contra os filhos, chegando a
deixar uma das meninas, quando bebê, em completo abandono.
A liminar foi obtida e as crianças foram levadas. A. interpôs um agravo de
instrumento, afirmando que os fatos descritos eram “mentirosos e
infundados” e apresentando documentos que comprovavam que as crianças não
sofriam violência. Uma declaração da creche confirmou que, embora não
regularmente, eles frequentavam a escola, mostrando-se “limpos e bem
cuidados”.
Disputa pela guarda
Em março de 2003, o Tribunal de Alçada concedeu a guarda definitiva à mãe.
No Natal daquele ano, O.B.M., o pai das crianças, deixando a cadeia para
cumprir liberdade condicional, procurou A. e solicitou que ela deixasse os
meninos visitarem a avó paterna com ele. Ele teria se comprometido a
trazê-los de volta no mesmo dia. No entanto, segundo a mulher, o ex-marido
distribuiu as crianças entre seus parentes e impediu-a de se aproximar dos
filhos.
A. impetrou uma medida cautelar, que foi deferida liminarmente, para
reaver os menores. Mas, na contestação, o pai destacou “o desmazelo e a
negligência da ex-esposa em relação aos próprios filhos”, acusando-a de se
prostituir. Ele apresentou ainda uma escritura pública na qual a
trabalhadora rural reconheceria que O. tinha condições de assumi-los e
concordaria em ceder-lhe a guarda das crianças. Com isso, a liminar foi
revogada.
Ação na Justiça
A escritura, porém, como foi apurado em inquérito policial, era falsa e a
suposta assinatura não era da mãe dos menores. A situação, segundo a
mulher, gerou dor e incerteza. Representando os filhos, em 2006, A.
ajuizou ação de indenização por danos morais contra a tabeliã H.,
responsável pelo cartório de notas no qual, acompanhado pela irmã, que se
fez passar pela ex-cunhada, O. lavrou a falsa escritura por meio de
documentos furtados à ex-mulher.
A tabeliã defendeu que a escritura não poderia ser causa de dor moral.
“Ela não produziu modificação alguma no direito de A., pois, quando foi
confeccionada, a mãe já não dispunha da guarda dos filhos por não ter sido
encontrada pelo oficial de Justiça”, argumentou. Além disso, acrescentou
ela, “na única vez em que o pai pretendeu usá-la, a escritura nem sequer
foi acolhida como prova”.
H. argumentou, ainda, que o responsável pelo ocorrido era o tabelionato e
não a pessoa dela, notária, que não teve culpa, pois não foi ela que
confeccionou a escritura. A tabeliã ainda defendeu que estava ausente o
nexo causal entre o dano efetivamente causado e a responsabilidade pelo
acontecimento.
Sentença e decisão
O juiz da 2ª Vara de Guaxupé considerou a causa improcedente, porque não
houve comprovação de dolo da parte do cartório. Para o magistrado, a
tabeliã procedeu segundo as normas do seu ofício, conferindo os
documentos. “Não é culpa dela se a documentação foi obtida de forma
desonesta por falsários”, esclareceu.
A mãe das crianças apelou da sentença no final de 2009. Por maioria de
votos, os desembargadores do TJMG optaram pela reforma da sentença. O
relator, desembargador Valdez Leite Machado, salientou que a
responsabilidade do cartório é objetiva e que “os danos sofridos são
evidentes, porque, graças à escritura falsificada, a autora se viu privada
da guarda das crianças e os filhos, afastados da mãe, também foram
prejudicados”. Ele fixou a indenização em R$ 9.300.
Como houve divergência entre os magistrados, já que a desembargadora
revisora, Evangelina Castilho Duarte, considerou a importância
insuficiente para as circunstâncias do caso e a vogal, desembargadora
Hilda Teixeira da Costa, entendeu que a tabeliã agiu de boa-fé, o valor
que prevaleceu foi o de R$9.300, por ser a quantia intermediária entre os
três posicionamentos (voto médio). |